
Por Kant de Voronha
Na terra onde os ventos da liberdade um dia prometeram soprar, um silêncio doloroso insiste em calar as vozes dos visionários. O solo moçambicano, regado por sangue de idealistas, enterra, mais uma vez, as sementes da mudança, transformando-as em sepulturas. Elvino Dias e Paulo Guambe, cujos corpos repousam hoje, são mais do que vítimas de assassinatos políticos; são metáforas do destino cruel que abraça aqueles que ousam sonhar com um Moçambique livre da tirania da impunidade.
Esses crimes não são apenas tiros disparados na calada da noite. São facadas profundas em nossa já desgastada esperança. São testemunhos da realidade brutal que engole todos aqueles que se erguem com coragem diante do poder. Criminosos políticos, ocultos por máscaras de autoridade, caminham livremente, enquanto os líderes visionários são abatidos, um por um, como se fossem peças descartáveis no tabuleiro de xadrez da política nacional.
Impunidade. Palavra que ecoa, insistente, nas esquinas das ruas sujas de sangue. Para muitos, Moçambique se tornou um país onde a justiça é um fantasma que se recusa a assombrar os culpados. Homens como Elvino Dias, que advogavam por um futuro melhor, são assassinados em plena luz do dia, em um show cruel de balas que fazem ecoar o som do desespero. Paulo Guambe também se despede da vida, vítima de uma política suja, que não se contenta em eliminar apenas as ideias; ela vai além, ela extermina corpos.
“Ninguém consegue aranhar o seu próprio dedo”, diz o velho ditado. Mas em Moçambique, parece que o próprio país se mutila. A nação, que deveria proteger seus filhos, esmaga-os sob o peso de sua própria corrupção. E é exatamente aí que reside o paradoxo: quem deveria ser a mão curadora se transforma na lâmina que fere.
Quantos mais precisarão morrer? Quantas famílias ainda terão que chorar a ausência dos seus? Quando veremos, enfim, justiça para aqueles que ousaram desafiar o status quo e foram cruelmente silenciados por isso?
A política moçambicana transformou-se num campo minado, onde cada passo pode ser o último, e onde a verdade, nua e crua, é considerada uma afronta perigosa. Mas apesar disso, as balas que assassinam corpos jamais poderão matar ideais. O sangue dos mártires se infiltra na terra, germinando sementes invisíveis de resistência. O sacrifício de Elvino Dias e Paulo Guambe não será em vão. Eles são lembrados por todos os que ainda ousam sonhar, que ainda acreditam que a justiça não pode ser eternamente calada.
Os criminosos políticos podem escapar do alcance das mãos humanas, mas não conseguirão fugir dos tribunais da história. O tempo, este juiz implacável, revelará o verdadeiro custo dessas vidas ceifadas e, embora tardia, a justiça finalmente florescerá. Afinal, um país não pode para sempre arranhar seu próprio dedo sem, eventualmente, sentir a dor profunda dessa ferida.
Enquanto enterramos mais dois filhos desta pátria, que a nossa luta continue, não com armas de fogo, mas com palavras, ideais e a determinação inabalável de que um dia Moçambique será, verdadeiramente, uma nação de liberdade, justiça e respeito à vida humana. Para Elvino Dias, Paulo Guambe e tantos outros visionários abatidos, a nossa promessa é clara: vocês viverão, não nas sombras de uma pátria impune, mas nos corações de todos que carregam o vosso sonho.