Por Kant de Voronha
Em Moçambique, onde a palavra deveria ser o escudo da verdade e o farol que ilumina os becos da injustiça, muitos jornalistas abandonaram a ética em troca de privilégios. Como mercadores do silêncio, vendem suas penas ao regime, tingindo as páginas de jornais e as ondas da rádio e TV com narrativas distorcidas, enquanto a realidade sangra nas ruas.
Nas manifestações, onde o povo ergue a voz contra o abuso, a fome e a opressão, os jornalistas transformam gritos de dor em ecos de propaganda. As balas disparadas pela polícia e pela Unidade de Intervenção Rápida (UIR) contra cidadãos desarmados são omitidas ou, pior, justificadas. Os corpos caídos tornam-se números apagados em manchetes frias, enquanto os protestos legítimos são descritos como “ações subversivas”.
Esses jornalistas, outrora guardiões da liberdade, agora se curvam diante do poder. Os microfones que deveriam ampliar as vozes do povo servem para sufocá-las. As câmeras que poderiam registar a verdade se voltam para onde o governo aponta, ignorando o sangue no asfalto e o clamor por justiça.
Mas o que motiva esse silêncio conivente? O medo, sem dúvida, tem seu papel. Afinal, um país onde questionar pode custar a liberdade ou a vida não é lugar para corajosos de conveniência. Porém, há também quem se venda por muito menos: uma promessa de estabilidade, um envelope gordo, um lugar na mesa do banquete governamental.
Enquanto isso, o povo se vê traído. Aquele que deveria ser a voz dos sem voz tornou-se cúmplice do silêncio imposto. E assim, a história que chega aos lares é apenas uma sombra distorcida da verdade, favorecendo os algozes e vilanizando as vítimas.
Mas nem todos se calam. Há jornalistas que ainda se arriscam, que insistem em reportar o que veem, mesmo que isso custe caro. Esses poucos, muitas vezes isolados e perseguidos, são a lembrança de que o jornalismo ainda pode ser o que deveria: a luz que expõe as trevas.
Ao povo, resta a resistência. Resta desconfiar das palavras suaves que vêm dos noticiários e buscar a verdade nas ruas, nas redes sociais, nos relatos dos que estão na linha de frente. Porque, enquanto os jornalistas vendidos sustentarem o regime com suas mentiras, a luta pela justiça e liberdade será ainda mais árdua.
E para os que se venderam, a história será implacável. O tempo não esquece aqueles que traíram seu povo em troca de favores. Quando Moçambique se libertar, como um dia inevitavelmente acontecerá, seus nomes estarão gravados não entre os heróis, mas entre os que ajudaram a prolongar a dor de uma nação.