Por Kant de Voronha
Muitas vezes, a fé é vista como uma barreira para a atuação política. Alguns argumentam que quem é comprometido com princípios religiosos deve permanecer à margem, longe das arenas políticas, como se a espiritualidade e o compromisso social fossem mundos separados. Mas esta ideia é um erro fundamental. O homem, como ensinava Aristóteles, é um animal político. Ser político é parte da nossa essência, uma expressão do nosso ser em sociedade, um compromisso inadiável com o bem comum.
A fé, quando bem compreendida, não é um obstáculo à ação política, mas uma força que a impulsiona. Acreditar em algo maior, seja Deus, a justiça ou os princípios éticos, é uma motivação poderosa para trabalhar pelo bem coletivo. A fé verdadeira não nos isola; ela nos conecta, nos faz enxergar no outro um irmão, uma irmã, alguém digno de dignidade e respeito.
Jesus, por exemplo, não foi político no sentido partidário, mas suas ações eram profundamente políticas no sentido mais puro: ele questionou estruturas injustas, desafiou poderes opressores e promoveu um reino de valores que buscava transformar o mundo. Ser político, nesse sentido, é ser agente de mudança, movido pela ética, pela compaixão e pela coragem de enfrentar as desigualdades.
É importante distinguir política de partidarismo. Política é a arte de organizar a vida em sociedade, de encontrar caminhos para que todos tenham acesso aos direitos fundamentais e às condições de uma vida digna. Partidarismo, por outro lado, é a filiação a um grupo que disputa o poder, muitas vezes com interesses particulares.
A política autêntica transcende o partidarismo. Ela não se limita a cores, bandeiras ou slogans; ela se alicerça na busca incessante pela justiça, pela igualdade e pelo bem comum. Um político autêntico, movido por princípios éticos ou de fé, pode ser um catalisador de transformações reais, sem comprometer sua integridade ou valores.
Como seres políticos, não podemos nos esquivar das responsabilidades que a vida em sociedade nos impõe. Ser político não significa necessariamente ocupar cargos ou disputar eleições, mas atuar onde estivermos para promover a justiça, a paz e a solidariedade.
A fé não nos afasta desse chamado; pelo contrário, ela nos fortalece para enfrentarmos as injustiças, para sermos voz dos que não têm voz e para buscarmos, incansavelmente, a construção de um mundo mais humano. Como alguém movido pela fé, não posso me contentar em observar passivamente as desigualdades, a corrupção e a falta de empatia que assolam nossas sociedades.
Ser um político autêntico exige coragem. Coragem para ser diferente num mundo onde o poder muitas vezes corrompe. Coragem para lutar por valores num sistema que muitas vezes recompensa a desonestidade. Coragem para ser uma luz em meio à escuridão.
A minha fé, longe de ser uma âncora que me prende, é o leme que me guia. Ela me lembra que a verdadeira política é serviço, é doação, é trabalhar para que o bem de todos prevaleça sobre os interesses de poucos.
Não podemos fugir à nossa natureza política, nem nos esconder atrás de pretextos. A fé e a política não são inimigas, mas aliadas na construção de um mundo melhor. É possível ser político sem perder a essência, sem se contaminar pelo jogo sujo. É possível trazer a ética, a verdade e o amor pelo próximo para a esfera pública.
Se ser político significa cuidar das pessoas, transformar realidades e promover a justiça, então minha fé não só me permite ser político, como exige que eu o seja.
Assim, reafirmo: a minha fé não me impede de ser um político autêntico. Pelo contrário, ela é o que me torna um. E mais não disse.