Por Kant de Voronha
O jovem agarrou a arma com as mãos firmes e o coração em chamas. Não era apenas um ato de coragem; era um grito de desespero e indignação. Ele havia enfrentado a tropa que deveria proteger o povo, mas que agora se tornara guarda-costas de uma elite predadora. Ali, no calor do protesto, ele arrancou do policial o instrumento que simbolizava décadas de opressão. O olhar dele dizia tudo: esta arma é nossa, e com ela, vamos mudar a história deste país.
Nos últimos 50 anos, Moçambique foi saqueado por aqueles que juraram libertá-lo. A bandeira que carregamos no peito traz as armas da luta contra o colono português, mas quem nos oprime hoje tem o mesmo rosto que o nosso. A Frelimo, que prometeu um futuro de prosperidade, se tornou o novo colono. Substituíram a bandeira portuguesa, mas mantiveram o chicote. Enquanto a minoria no poder desfruta de luxos inimagináveis, o povo dorme com fome, acorda com sede e luta para sobreviver.
A arma que o jovem empunhava naquele instante era mais do que um objeto de guerra. Ela era o símbolo de uma segunda independência, da revolta contra décadas de promessas quebradas e esperanças pisoteadas. Ele sabia que, mais do que munição, aquela arma carregava um significado poderoso: o povo não está mais disposto a ajoelhar.
Em Moçambique, o desemprego é a norma, a miséria é o chão e a corrupção é o teto. Os hospitais são cemitérios à espera, as escolas são depósitos de crianças abandonadas pela educação, e o campo, que antes alimentava as famílias, agora sustenta os bolsos de investidores estrangeiros e líderes inescrupulosos. A liberdade que os nossos antepassados sonharam se tornou uma ilusão cruel.
Mas a paciência do povo acabou. A juventude, esmagada pela falta de oportunidades, pelas balas da repressão e pela violência da pobreza, está dizendo basta. E esse grito ecoa em cada rua, em cada praça, em cada casa onde o arroz e o feijão já não chegam à mesa.
Quando o jovem levantou a arma, não era para atirar. Era para mostrar que o povo não precisa mais se curvar. Aquele gesto era uma declaração de guerra, não contra um inimigo externo, mas contra a tirania interna que transformou Moçambique num país de exilados dentro de suas próprias fronteiras.
A bandeira nacional carrega uma arma porque ela simboliza a luta pela liberdade. Mas que liberdade é essa, se o povo continua escravizado? Quem vive em Moçambique hoje sabe: a independência de 1975 foi apenas o início de uma nova dominação. A elite no poder se apropriou dos recursos naturais, privatizou a esperança e transformou a dor alheia em seu maior património.
O jovem sabia disso. Ele não era apenas um manifestante; ele era o porta-voz de milhões que não têm voz. Sua coragem não era isolada; ela era o reflexo de uma nação cansada, sufocada, humilhada. Quando ele gritou que aquela arma era do povo, ele não falava apenas do objeto em suas mãos. Ele falava da terra, dos rios, das florestas, das riquezas que pertencem a todos, mas que têm sido saqueadas por poucos.
“Esta arma é nossa. Por ela, libertaremos Moçambique.” Essas palavras ecoaram como um trovão, ressoando no coração de cada moçambicano que anseia por justiça. Não é uma declaração de violência; é um manifesto de liberdade. O povo já não quer armas que matem; quer armas que salvem. E essa arma, arrancada das mãos da repressão, tornou-se o símbolo de uma revolução que não pode mais ser sufocada. Por isso o jovem foi entregar no posto policial da localidade de Mangungumete, em Inhambane.
Moçambique está à beira de uma nova independência. Não será uma guerra de balas, mas de coragem, de dignidade, de justiça. Quem está no poder deve entender: o povo não é mais refém. A arma agora está nas mãos de quem luta por um país verdadeiramente livre.
E dessa vez, ninguém vai nos roubar a vitória. E mais não disse!